ARTIGOS

I Fórum de Debates

ECOLOGIA DA PAISAGEM E PLANEJAMENTO AMBIENTAL

 

ESTRUTURA DA PAISAGEM DE DUAS ILHAS COSTEIRAS DE SANTA CATARINA

 

Alexandre M. Mazzer1, Marcus Polette2

1Depto Geografia UNIVILLE

2Lab. Planejamento da Paisagem Costeira- CTTMar/ UNIVALI

 

INTRODUÇÃO

O surgimento da Ecologia da Paisagem se deu a partir de estudos de Geografia Física e o desenvolvimento da Ecologia como ciência, tendo como pioneiro do uso deste termo e desta abordagem o alemão TROLL (1937), conforme ZONNEVELD (1995).

O arranjo de hábitats e sua disposição dentro de uma paisagem refletem a estrutura da paisagem, bem como eventos ao longo do tempo promovem a heterogenidade. FORMAN (1995). Elementos como rocha, água, solo, vegetação se interagem e criam estruturas no tempo e no espaço, conforme ZONNEVELD (1995).

No caso da Zona Costeira temos um incremento na complexidade destas interações, (devido as fortes interações mar-ar-terra) formando mosaicos de estruturas distintas. As ilhas fazem parte deste cenário, tendo ainda como característica adicional de reproduzirem condições ambientais da zona costeira em área restrita e menor escala.

A nível de estrutura da paisagem, a vegetação tem sido bastante como indicador dos padrões ambientais atuantes, sendo que os processos geológicos e geomorfológicos exercem importantes papéis na regulação dos fluxos de energia e matéria.

O presente estudo procurou investigar a existência de padrões na estrutura das paisagens insulares do Estado de Santa Catarina, a partir do estudo comparativo entre duas ilhas selecionadas por diferentes critérios a nível regional.

 

METODOLOGIA

Levantamento e caracterização

Foram realizados levantamentos bibliográficos e cartográficos das ilhas existentes, dentre vários temas incluindo geologia/geomorfologia, clima e vegetação, sendo que encontra-se em MAZZER (1998) na forma de lista e tabelas caracterização das ilhas.

Escolha das ilhas

A partir da caracterização foram selecionadas duas ilhas,a partir de dois critérios que se seguem: localização em setores litorâneos distintos, quanto a clima, geologia da costa e vegetação, (MAZZER op.cit); e considerando a Teoria de Biogeografia de Ilhas de MaC ARTHUR & WILSON, (1967), que baseia-se nas diferenças de área e distância da costa. Um terceiro critério considerado na escolha foi o logístico, o qual juntamente com os dois primeiros resultou na seguinte escolha: Ilha média próxima a costa e Ilha média distante da costa

Mapeamento

Foram feitas mapeamentos prévios do tipo de formação que se encontrava com estereoscopia utilizando fotos aéreas de 1: 25.000 do ano de 1978. Onde pode ser constatado e delimitado diferentes alturas e composições, que foi devidamente caracterizado por formações como veremos adiante. Realizou-se um estudo das zonas de declividades através de ábaco de papel vegetal (com 5 classes de variações de 1°-20° até > 47°) e base topográfica do IBGE (escala 1: 50.000).

Saídas de campo

As saídas de campo foram realizados por embarcações de comunidades pesqueiras próximas às ilhas. Foram realizados identificação da fisionomia da vegetação pelo método da caminhada (FILGUEIRAS et al, 1996). Nas saídas de campo percorreu-se a maior parte das ilhas, incluindo as porções sem trilhas, além de navegações circundando a ilhas, e obtendo em ambas atividades registros fotográficos, para posterior análise.

Análise da Estrutura da Paisagem

A análise da estrutura da paisagem compreende-se num estudo das relações entre os elementos da paisagem em cada ilha, constituindo-se de uma análise numa escala local, onde cada ilha é compartimentada em encostas, ou sub-bacias, baseado em POLETTE (1993). Para cada unidade foi verificado a relação entre as manchas de vegetação a declividade e as características geomórficas. Foi efetuado uma transversal para a cada ilha afim de realizar uma análise comparativa entre estas, frente as variações na estrutura.

Foi realizado também o agrupamento das espécies vegetais que estavam nitidamente obedecendo uma relação biogeocenótica, em formações vegetais, baseado nos trabalhos de KLEIN (1979, 1980) e POMPÉIA et. al., (1992), adaptados para a presente pesquisa. Com base no observado nos estudos de caso e observações em campo as formações das ilhas podem ser agrupadas em:

Formação xerófita- que é composta daquelas plantas que toleram condições edáficas restritas de água além de tolerar a salinidade, o porte predominante é o arbustivo e herbáceo, geralmente com ramificações tortuosas.

Formação mata densa - constituída de espécies ombrófilas e semi-ombrófilas, porte geralmente arbóreo a arbustivos em algumas ilhas, presença de epifitismo

Formação antrópica- formadas por espécies de vegetação exótica ao local, introduzida na ilha pelo homem, direta ou indiretamente.

 

RESULTADOS E DISCUSSÕES

As Ilhas Feia e das Araras foram caracterizadas quanto aos elementos da estrutura da paisagem o qual segue-se abaixo:

TABELA 1: Elementos da paisagem das ilhas estudadas

ILHA/ SETOR

CLIMA

Geologia

Alti-tude

ÁREA

(m2)

Distan-cia da costa

VEGETAÇÃO

(formações)

S

Ilha Feia/

18°-20°C

1600-1800 mm

Milonito-Gnaisses

76

117.084

1,8 Km

mata densa

xerófita

antrópica

41

Ilha das Araras/

18°-16°C

<1400 mm

Granito Serra do Tabuleiro

47

127.853

5,0 Km

mata densa

(formação com influencia marinha-Restinga)

Xerófita

antrópica

32

As ilhas mostraram-se com diferentes influências dos elementos da estrutura da paisagem. Os distintos tipos climáticos e litológico, resultam em um diferente retrabalhamento morfológico, corroborado por diferentes climas de ondas.

Enquanto a Ilha Feia, apresenta-se com a forma semi-circular, a Ilha das Araras encontra-se de forma alongada, obedecendo os sentidos de falhas e distensões das rochas do local ( NE-SO) CARUSO (1995). O retrabalhamento desta última tende a oferecer mais resistência por se constituir de rocha granítica, conforme VILES & SPENCER (1995). A Ilha Feia é compartimentada em três sub-bacias que apresentam-se com graduais mudanças na estrutura da paisagem frente a exposição ao oceano e seu intempéries, além de apresentar um topo aplainado constituindo um localidade distinta do ponto de vista biótico insular. A ilha das Araras possuí duas sub-bacias bem definidas e divididas por interflúvio anguloso e simétrico ao alongamento da ilha. Foi notado grande diferença entre as sub-bacias da Ilha das Araras que pode ser atribuída a sua configuração espacial. A sub-bacia voltada para leste recebe influências de salinidade, ventos mais intensos e impacto maior das ondas em seu arcabouço litológico, tendendo a predominar a formação xerófita; na sub-bacia voltada a oeste encontram-se as espécies vegetais mais desenvolvidas quanto a altura e composição de espécies ( formação mata densa) com a presença de epífitismo, e solos mais desenvolvidos.

Conforme a Teoria de Biogeografia de Ilhas de MaC ARTHUR & WILSON (1967) o número de espécies é inversamente proporcional à distância da costa, devido a maiores taxas de imigração, no caso continente-ilha. A Ilha das Araras chega a ser quase três vezes mais distante que a Ilha Feia e a complexidade de sua vegetação reflete este parâmetro, sendo que apresenta a formação xerófita e mata densa com poucas espécies. Além de que na última formação temos uma forte influência marinha em sua composição, com o predomínio das espécies Rapannea parvifolea e Dalbergia ecastiphylum que alcançavam no máximo 8 metros de altura.

Provavelmente devido a maior proximidade de promontórios rochosos cobertos pela Floresta Ombrófila densa, a Ilha Feia apresenta-se na sua maior parte cerca de 90% coberta pela formação mata densa dominada pelos Camboatás e Gerivas, refletindo uma maior presença da umidade referente ao clima regional (vide tabela 1) e aos microclimas que aparecem devido as mudanças graduais de sua forma frente ao intempéries externos à ilha. A altura chega a 20 metros nos indivíduos maiores. A formação xerófita da Ilha Feia apresenta um maior numero de espécies dominantes do que a Ilha das Araras.

A temperatura mais elevada e a maior taxa de precipitação anual da Ilha Feia corrobora com a ocorrência de uma vegetação mais exuberante frente ao decréscimo de 2°C e aproximadamente 200 mm no clima regional da Ilha das Araras.

O padrão de ocorrência e distribuição das formações vegetais mostram-se bastante correlacionados com a morfologia das ilhas e suas feições geomórficas decorrentes, bem como do padrão regional do clima, que mostram-se influentes, sobretudo no tipo de vegetação, quanto a composição de espécies e porte.

Não obstante as ilha possuem semelhanças que parecem nos mostrar serem estas características típicas de ilhas continentais do sul do Brasil, já que foram encontradas em outras ilhas por MAZZER, (1998). A diferença de estrutura da paisagem entre encostas expostas diretamente ao mar e as protegidas refletem nas feições morfológicas, formações de solo e fitofisionômicas de ambas as ilhas estudadas. Sendo que nas primeiras temos o comprimento de rampa mais curto e terminado em escarpa, declividades mais acentuadas e predomínio da formação xerófita, já nas encostas protegidas teríamos o desenvolvimento de rampas mais longas com declividades menores e condições ambientais mais propícias a ocupação por indivíduos de Floresta Ombrófila Densa, por vezes formando matas bem desenvolvidas, como no caso da Ilha Feia.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARUSO, F.1995. Mapa Geológico e de recursos minerais do sudeste de Santa Catarina, escala 1:100.000- Texto explicativo e mapa. Brasilia: DNPM (Programa Cartas de síntese e estudos de integração geológica, n°1).

FILGUEIRAS, T. S.; NOGUEIRA, P.E.; BROCHADO A. L.; GUALA II, G. F.; 1994. Caminhamento- Um método expedito para levantamentos florísticos qualitativos. Cadernos de Geo ciências n° 12. IBGE- Diretoria de Geociências, Rio de Janeiro.

FORMAN R.T.T.1995. Land Mosaics: The Ecology of Landscape and RegionsCambridge University Press, Great Britain. 632 p.

MaC ARTHUR, R.H.& WILSON E.; 1967. The Theory of island biogeography. Princeton University press.

MAZZER, A.M.; 1998 Análise de Ecologia da Paisagem em Ilhas do Litoral do Estado de Santa Catarina.Trabalho de Graduação.(Orientação: Dr. Marcus Polette) CTTMar/UNIVALI. Itajaí.

POLETTE, M.;1993. Planície do Perequê/Ilha de São Sebastião - Diagnóstico e Planejamento Ambiental Costeiro. Dissertação, UFSCar. 197p..

POMPÉIA, S. L. PEREIRA, A.; ROSSI L.; AIDAR, M.P.M.;MORAES, R.P. SANTOS, R.P.; 1993. A vegetação da Ilha de Alcatrazes- São Paulo. In: III Simpósio de Ecossistemas da Costa Brasileira, Vol. II. Äguas de Lindóia: ACIESP.

VILLES H. & SPENCER, T.;1995. Rocky Coasts: cliffs and plataforms. In: Coastal Problems: Geomorphology, Ecology and Society.

ZONNEVELD, I. S. , 1995. Scope and Concepts of Landscape Ecology as na Emerging Science. In: ZONNEVELD, I. S. & FORMAN, R. (ed.) 1995- Changing Landscapes: An Ecological Perspective. Springer Verläg, New York.