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A INFLUÊNCIA DA MACRÓFITA AQUÁTICA Echinochloa polystachya (H.B.K.) HITCHCOCK NAS CARACTERISTICAS FÍSICAS E QUÍMICAS DA ÁGUA NA ZONA DE DESEMBOCADURA DO RIO PARANAPANEMA NA REPRESA DE JURUMIRIM - SP

 

 

Pompêo, M.L.M.1; Henry, R.1; Moschini-Carlos1, V.; Padovani, C.R.2

 

Depto. de Zoologia e 2 Bioestatística - UNESP - IB, - Botucatu - SP - 18618-000

 

  


RESUMO

Na zona de desembocadura do rio Paranapanema na represa de Jurumirim (SP, Brasil) a macrófita aquática emergente Echinochloa polystachya (H.B.K.) Hitch. domina a fisionomia vegetal. Enraizada nas margens, esta planta projeta seus colmos em direção à região pelágica. Os padrões sazonais de variáveis físicas e químicas da água no estande dessa gramínea e na calha principal do rio foram estudados. O trabalho visa mostrar a influência do estande de E. polystachya sobre essas variáveis. O padrão de variação anual da temperatura da água e da concentração de oxigênio dissolvido observada é decorrente das alterações da temperatura do ar. As modificações na concentração de material em suspensão e na condutividade elétrica foram associadas à alternância do regime de precipitação durante o ano. O rio apresentou tendência à homogeneidade nas variáveis físicas e químicas devido à movimentação da massa d’água. No estande, a camada de água mais próxima da superfície apresentou características diferentes das zonas intermediária e profunda. Comparando-se os valores de temperatura e de concentração de oxigênio dissolvido na água do estande com aqueles determinados no rio, as diferenças encontradas são estatisticamente significativas. Foram atribuídas à presença do estande de E. polystachya, que atua como barreira física à passagem da água e à ação do vento, que reduz a renovação e a homogeneização da massa de água.

Palavras-chave: macrófita aquática, Echinochloa polystachya, represa, rio Paranapanema, ciclo hidrológico, características físicas e químicas


 

 

INTRODUÇÃO

 

Em regiões tropicais, as macrófitas aquáticas presentes na zona de desembocadura dos rios nos reservatórios apresentam grande biomassa, contribuindo sobremaneira para a produção de matéria orgânica para o ecossistema aquático. Podem apresentar importante papel na transferência de nutrientes entre a fase aquática e a terrestre (14), com a potencialidade de controlar a dinâmica de nutrientes no ecossistema (21). Além disso, os estandes das macrófitas aquáticas também possibilitam a existência de inúmeros microhabitats, onde uma considerável gama de organismos pode passar parte ou todo seu ciclo de vida, depositando ovos, protegendo-se de predadores, alimentando-se. Assim, a água do estande de macrófitas aquáticas poderá ser um compartimento diferenciado das águas abertas, refletido por diferenças físicas, químicas e biológicas. Os experimentos efetuados por Dale & Gillespie (5), sugerem que a temperatura da água sofre influências do próprio arranjo das folhas da população de macrófitas aquáticas bem como do índice de área foliar. A interceptação da energia luminosa pela superfície foliar aquece a água localmente, enquanto que na parte de baixo, devido ao sombreamento, tende a ser menor. Desta forma, segundo Esteves (7), os estandes das macrófitas aquáticas constituem-se num compartimento muito complexo, que devem ser analisados separadamente da região de águas abertas.

Este trabalho mostra os padrões sazonais de variáveis físicas e químicas da água no estande de Echinochloa polystachya (H.B.K.) Hitchcock e na calha do rio Paranapanema (SP, Brasil). Visa também verificar a influência do estande sobre essas variáveis.

 

LOCAL DE ESTUDO

 

A represa de Jurumirim (reservatório Engenheiro Armando Avellanal Laydner) está localizada na porção sul do Estado de São Paulo e é a primeira represa no sentido montante-jusante do complexo de barragens que se sucedem no rio Paranapanema. Na cota 570m, a água de superfície do reservatório cobre uma área de cerca de 484km2 e o seu volume é estimado em 7.941hm3. A bacia hidrográfica apresenta cerca de 17.800km2. É um reservatório oligotrófico, com baixa produtividade primária fitoplanctônica na zona de barragem, e o crescimento das algas provavelmente é limitado pelo fósforo (9, 10).

Na zona de desembocadura do rio Paranapanema no reservatório (Figura 1a), são observadas, além do canal do rio, extensas áreas inundadas, ambas margeadas por estandes de macrófitas aquáticas emergentes, predominantemente por E. polystachya. A gramínea E. polystachya apresenta um colmo robusto com mais de 15m de comprimento, que está enraizado nas margens, projetando-se em direção às águas abertas (Figura 1b). Esta macrófita aquática apresenta elevada biomassa (1.150 a 2.756gPS/m2) e estoque de nutrientes (0,36 a 4,43kgP/m2 e 9,6 a 46,0kgN/m2), e tem uma produção primária estimada em 30t/ha/ano (21).

 

a)

b)

 

 

Figura 1: a) Local de estudo na zona de desembocadura do rio Paranapanema na represa de Jurumirim e b) estande de E. polystachya com a localização das profundidades de colata de água. (S= superfície; M= meio; F= fundo).

 

MATERIAIS E MÉTODOS

As amostras de água foram coletadas mensalmente em 3 profundidades em dois pontos fixos, um no interior do estande de E. polystachya e outro imediatamente na margem do estande, no canal principal do rio Paranapanema, (Figura 1).

 

 

Foram determinadas as temperaturas do ar e da água com um termistor Toho Dentan (± 0,10C), o material em suspensão total (MST) (24, 29), o oxigênio dissolvido pelo método Winkler (8), a condutividade elétrica (com um condutivímetro Hach Mod. 2511, tendo os valores corrigidos para 250C (8), e o pH (potenciômetro Micronal B 371). Para a estimativa dos teores dos nutrientes dissolvidos, a água foi previamente filtrada em filtro Millipore AP40 e o filtrado armazenado em frascos de polietileno e estocados em freezer. Em laboratório, foram feitas as análises de nitrato e nitrito (17), amônio (15), fosfato inorgânico dissolvido (FID) e fosfato total dissolvido (FTD) (23).

A variação do nível da água foi determinada mediante leitura em régua graduada instalada no interior do estande. Foram obtidos os valores das cotas diárias do nível da água (cotas das 9h00min) e das vazões no setor operacional da barragem, as temperaturas máxima e mínima e as precipitações diárias na estação climatológica da Cooperativa Agro Industrial Holambra (Fazenda Holambra, Paranapanema, SP), localizada a cerca de 30Km em linha reta do local de estudo.

Os dados climatológicos foram submetidos a uma análise de agrupamento através da classificação hierárquica ascendente, utilizando-se a distância Euclidiana, tendo como critério de agregação as médias das distâncias ponderadas. Os cálculos foram efetuados através do programa estatístico STAT-ITCF 4.0. Os dados foram previamente padronizados pela subtração da média e divisão pelo desvio padrão (4).

As diferenças entre as profundidades de coleta de água (no rio e estande) em cada um dos grupos experimentais (variáveis) foram detectadas através do uso da técnica de análise multivariada, complementada com a construção dos intervalos de confiança simultâneos (18).

Os valores das variáveis físicas e químicas na água do rio e do estande foram comparados entre si e também com aqueles encontrados por outro autor (19) em uma baía permanentemente inundada e ligada ao rio Paranapanema, próximo ao local deste estudo, igualmente através do método de Morrison (18).

 

RESULTADOS

 

As maiores temperaturas do ar foram observadas no período de outubro/93 a março/94 (Figura 2). A variação anual da temperatura do ar medida no local de estudo nos dias de coleta mostra padrão semelhante à temperatura do ar medida no posto de observação climatológica (Figura 3). A precipitação mostrou marcado padrão sazonal, com maiores valores em janeiro de 94 e em setembro/93 (Figura 2).

 

Figura 2: Médias mensais das temperaturas máximas e mínimas (0C) e a precipitação mensal (mm) obtidas no posto de observação climatológica da Fazenda Holambra.

Figura 3: Altura da régua (m) no interior do estande e temperatura do ar (0C) no local de estudo.

 

A análise de agrupamento (Figura 4), permitiu identificar dois períodos climatologicamente distintos durante o ano de estudo. O primeiro compreendeu os meses de menores temperaturas e precipitações (abril a setembro) e o segundo período incluiu os meses de maiores precipitações e temperaturas (de outubro a março).

A variação anual do nível da água (cota) mostrou também uma oscilação bem marcada (Figura 5). Entre o início de agosto e o final de setembro/93 ocorreu uma pequena diminuição do nível da água. Posteriormente, em função da elevada precipitação ocorrida em meados de setembro/93, houve uma rápida elevação, atingindo um pico máximo no início de outubro/93. Seguiu-se um gradativo abaixamento até janeiro/94 (período de menor nível da água). A partir de fevereiro/94 ocorreu uma rápida elevação, devido principalmente às intensas precipitações ocorridas em janeiro/94 e associadas com as vazões mais baixas, propiciaram acúmulo de água no reservatório. A partir do final de fevereiro e início de março/94, o nível da água manteve-se relativamente estável até julho/94.

 

Desta forma, foi observada uma amplitude de mais de 2m na variação do nível da água. Esse padrão de variação é em grande parte devido à operação do reservatório, particularmente relacionado às alterações de vazão.

Figura 4: Dendrograma baseado nos valores de temperaturas máximas e mínimas e de precipitações, obtidos no posto de observação climatológica da Fazenda Holambra.

A variação do nível da água determinada no interior do estande de E. polystachya (Figura 3), tem padrão de variação similar ao das cotas.

O modelo de superfície Z=a+bX+cY+dX2+eXY+fY2, onde Z= temperatura (0C), Y= profundidade (m), X= mês e a, b, c, d, e e f constantes, aplicado aos valores de temperatura da água na superfície, meio e fundo mostrou-se estatisticamente significativo (Figura 6). Para ambos os locais, observa-se padrão semelhante na variação anual, com temperaturas mais elevadas entre os meses de outubro/93 e março/94, coincidente com o padrão observado para a temperatura do ar. A temperatura do ar mostrou-se positivamente correlacionada com a temperatura da água do rio (r=0,67, p<0,05) e do estande (r=0,65, p<0,05). A temperatura da água do estande e do rio também apresentaram-se correlacionadas (r=0,99, p<0,05).

Figura 5: Variação anual do nível da água (cota - m) e da vazão efluente (m3/s) da represa de Jurumirim.

  Em relação à condutividade elétrica na coluna d’água, maiores valores foram medidos nos meses de novembro/93 a março/94 (Figura 6). A menor e a maior condutividade elétrica determinada na água do rio e do estande foram de 33,70 e 38,80m S/cm e 87,00 e 78,40m S/cm, respectivamente. O seu padrão de variação sazonal foi inverso aos observados para a precipitação e para a concentração de MST (Figura 7a). Uma correlação significativa entre os valores de condutividade elétrica dos dois locais foi também encontrada (r=0,64, p<0,05).

No rio, a concentração de MST apresentou padrão anual semelhante ao da precipitação. A concentração de MST apresentou amplitude de variação de 2,76 a 47,87mg/l e 8,08 a 72,30mg/l, no rio e estande, respectivamente. Maiores valores foram encontrados entre novembro/93 e março/94 (Figura 7a). Nenhuma relação significativa foi encontrada entre as concentrações de MST na água do rio e na presente na água do estande (r=-0,14, p<0,05).

 

 Figura 6: Variação anual da temperatura e da condutividade elétrica da água no rio Paranapanema e no estande de E. polystachya.

 

Figura 7: Variação anual da concentração de MST (a) e de oxigênio dissolvido na água do rio (b).

As menores concentrações de oxigênio dissolvido na água do rio foram encontradas entre os meses de novembro/93 a março/94 e as maiores de agosto a outubro/93 e de abril a julho/94 (Figura 7b). O padrão de variação anual apresentado pelo teor de oxigênio dissolvido foi inverso ao da temperatura da água. O padrão de variação sazonal da concentração de oxigênio dissolvido determinado na água do estande é apresentado na Figura 8. Também nenhuma correlação linear foi encontrada entre os

 

 

teores de oxigênio dissolvido determinados na água do rio e no interior do estande (r=0,24, p<0,05). Os teores de oxigênio dissolvido variaram de 3,78 a 8,97mg/l e 0,63 a 8,26mg/l, respectivamente para a água do rio e do estande.

 

Figura 8: Médias mensais (superfície, meio e fundo) do pH e valores de superfície das concentrações de MST e de oxigênio dissolvido (E - estande; R - rio).

O pH da água apresentou pequena amplitude de variação ao longo do ano, de 6,1 a 7,1 no rio e de 6,0 a 7,1 no estande (Figura 8). Nenhuma correlação significativa foi determinada entre o pH das estações de coletas de água (r=-0,14, p<0,05).

Em ambas as estações de coletas, as concentrações de nitrito apresentaram valores baixos e nenhuma correlação foi encontrada entre elas (Figura 9, r=-0,08, p<0,05). Os valores de nitrito variaram de abaixo do limite de detecção do método a 6,84m g/l no rio e 0,91 a 3,91m g/l no estande.

 

Figura 9: Médias mensais (superfície, meio e fundo) dos teores de nitrito, amônia, FID e FTD na água do rio e do estande. Para o teor de nitrato (estande) são apresentados os valores da água superficial.

Não foi verificada correlação linear entre as concentrações de nitrato e de amônia determinadas na água do rio e do estande (NO3- - r=0,16; NH4+ - r=-0,04, p<0,05), mas um padrão de variação inverso entre os valores de amônia e de nitrato é sugerido (Fig. 9). Os teores de nitrato variaram de 12,95 a 577,31m g/l no rio e abaixo do limite de detecção do método a 330,31m g/l no estande. Os de amônio variaram de 2,34 a 67,45m g/l no rio e 5,10 a 30,01m g/l no estande.

Os teores de fosfato, em geral, apresentam menores valores no final de 93 e início de 94, com exceção de FTD na água do rio, que apresentou um pico em fevereiro/94 (Figura 9). As concentrações de FID determinadas no rio e no estande estão correlacionadas entre si (r=0,62, p<0,05). Em relação aos teores de FTD, determinados na água dos dois locais, nenhuma correlação linear significativa foi encontrada (r=0,43, p<0,05). Os teores de FTD apresentaram a seguinte amplitude de variação: abaixo do limite de detecção do método a 51,45m g/l no rio e 9,34 a 57,21m g/l no estande. Os teores de FIT variaram de a abaixo do limite de detecção do método tanto no rio e no estande a 44,17m g/l (rio) e 51,16m g/l (estande).

 

Tabela 1: Valores médios das variáveis físicas e químicas para superfície (S), meio (M) e fundo (F) e resultados do teste estatístico multivariado (p<0,05).

 

variável

S

M

F

Fcal

Fcrit

conclusão

 

 

 

estande

 

 

 

oxigênio (mg/l)

4,01

5,10

5,50

4,76

4,46

S¹(M=F)

pH

6,6

6,5

6,5

0,14

4,46

S=M=F

cond. elétrica (mS/cm)

62,05

61,50

60,57

3,53

4,26

S=M=F

MST (mg/l)

18,74

32,55

33,70

5,81

5,79

S¹(M=F)

NO3- (mg/l)

101,73

188,80

200,46

6,24

5,14

S¹(M=F)

NO2- (mg/l)

2,04

2,25

2,55

3,19

5,14

S=M=F

NH4+ (mg/l)

18,22

18,49

18,19

0,01

5,14

S=M=F

FID (mg/l)

10,04

14,98

11,69

0,36

5,14

S=M=F

FTD (mg/l)

18,61

21,05

17,59

0,37

5,14

S=M=F

temperatura (0C)

22,07

21,57

21,42

4,47

4,26

S¹(M=F)

 

 

 

rio

 

 

 

oxigênio (mg/l)

7,05

7,37

7,15

1,76

4,10

S=M=F

pH

6,6

6,6

6,7

1,35

4,26

S=M=F

cond. elétrica (mS/cm)

59,49

57,92

58,24

0,17

4,10

S=M=F

MST (mg/l)

13,40

13,28

23,01

2,81

4,10

S=M=F

NO3- (mg/l)

236,14

246,51

219,74

0,53

4,10

S=M=F

NO2- (mg/l)

3,11

2,62

2,63

1,56

4,10

S=M=F

NH4+ (mg/l)

14,54

14,21

23,02

1,33

4,10

S=M=F

FID (mg/l)

11,13

8,56

12,27

1,15

4,10

S=M=F

FTD (mg/l)

17,02

14,06

17,61

0,98

4,10

S=M=F

temperatura (0C)

21,89

21,56

21,49

2,51

4,10

S=M=F

 

A análise multivariada indica que os valores das variáveis físicas e químicas determinadas em várias profundidades no rio não diferem do ponto de vista estatístico, sugerindo que não há gradientes verticais entre as variáveis medidas. O mesmo não foi observado para o estande. A comparação revelou que houve menores teores de oxigênio dissolvido, MST e nitrato e maior temperatura na camada superficial de água do estande, quando comparado com os valores determinados nas camadas mais profundas. Para estas variáveis um padrão de estratificação foi encontrado (Tabela 1).

 

Tabela 2: Valores médios dos parâmetros físicos e químicos ao longo do ano para rio (R), baía (B) e estande (E) e resultados do teste estatístico multivariado (p<0,05).

 

variável

Baía(1)

Estande

Rio

Fcal

Fcrit

conclusão

oxigênio (mg/l)

6,86

4,49

7,19

6,78

4,10

E¹(R=B)

pH

6,5

6,7

6,6

0,52

4,10

E=R=B

cond. elétrica (mS/cm)

55,12

58,75

58,55

1,86

4,10

E=R=B

MST (mg/l)

7,12

18,31

16,18

22,15

4,10

B¹(E=R)

NO3- (mg/l)

155,06

121,54

234,54

3,79

4,10

E=R=B

NO2- (mg/l)

1,90

2,44

2,59

1,34

4,10

E=R=B

NH4+ (mg/l)

14,69

17,48

17,13

0,49

4,10

E=R=B

FID (mg/l)

5,40

11,82

10,59

4,09

4,10

E=R=B

FTD (mg/l)

13,46

18,97

16,18

1,51

4,10

E=R=B

temperatura (0C)

22,25

22,22

21,64

6,01

4,10

R¹(E=B)

1 - Dados obtidos de MOSCHINI-CARLOS19.

 

Também pôde ser verificado através da análise multivariada diferenças estatisticamente significativas (p<0,05) entre os teores de oxigênio dissolvido na água do rio, do estande e da baía (Tabela 2), com valores maiores no rio e na baía. Com relação ao MST, menores concentrações são encontradas na baía, quando comparadas com aquelas do estande e do rio. A comparação dos valores revela que no rio há tendência de menor temperatura da água do que no estande e na baía.

 

DISCUSSÃO

 

De acordo com Nimer (20), a região do Alto Paranapanema apresenta temperatura média anual quase sempre inferior a 220C. No verão a temperatura média é superior a 220C. Os dados climatológicos provenientes do posto meteorológico da Fazenda Holambra e as medições efetuadas no local de estudo corroboram o padrão geral descrito por Nimer (20).

 

A temperatura média anual da água do rio Paranapanema foi de 21,60C, com uma amplitude de variação ao longo do ano de 14,70C. Drago (6) determinou para o rio Paraná (PR, Brasil), maiores amplitudes de variação entre superfície e fundo (17,10C e 15,60C, respectivamente). Thomaz et al. (28) registraram amplitudes de variação, ao longo do ano, de 11,6 e 13,30C, respectivamente para os rios Paraná e Ivinheima.

A variação anual da temperatura da água do rio Paraná (2, 28) e do Arroyo Toledo-Carrasco (Uruguai) (1), apresentou padrão de variação semelhante ao do rio Paranapanema, com temperaturas máximas entre dezembro e março e mínimas entre junho e agosto. O elevado coeficiente de correlação encontrado reflete a dependência da temperatura da água em relação à temperatura do ar, como assinalou Drago (6). Segundo Hynes (13), para grandes rios e a uma considerável distância de sua cabeceira, a temperatura da água é usualmente próxima à média mensal da temperatura do ar. Cole (3) também afirma que a temperatura da água apresenta um padrão de variação anual semelhante ao da temperatura do ar. Desta forma, como apontado por Schäfer (22), a temperatura, considerada um dos principais fatores climáticos, tem papel importante nas condições hidrológicas e ecológicas de um rio.

Drago (6) não observou diferenças significativas entre os perfis de temperatura da água do meio do canal e de ambas as margens do rio Paraná. Atribuiu essa homogeneidade ao processo de mistura originado pelo fluxo turbulento, que raramente propicia estratificação térmica vertical da água nos grandes rios. Embora o rio Paranapanema seja um curso de água com dimensões menores, a homogeneidade sugerida na análise multivariada no canal principal do rio pode ser explicada através da movimentação da massa de água propiciando sua mistura.

A relação inversa entre a variação anual da concentração de oxigênio dissolvido e a temperatura da água, é decorrente do fato de que a solubilização do oxigênio na água é função inversa à temperatura. Desta forma, nos meses de temperaturas mais elevadas, a menor solubilização desse gás acarreta teores mais baixos na água. O aumento da temperatura também acarreta elevação nas taxas de decomposição (14, 25), como conseqüência, pode ocorrer a diminuição dos teores de oxigênio no meio. As concentrações de oxigênio nos rios, segundo Schäfer (22), variam em função das condições climáticas regionais e de sua localização (em altitude ou na planície). Dessa forma, a marcada variação anual do teor de oxigênio dissolvido observada, pode ser explicada também em função das características meândricas e hidrodinâmicas do rio Paranapanema, particularmente a montante do local de estudo. Apesar de acarretar mistura na massa d'água, provavelmente a turbulência não causa oxigenação, e consequentemente alterações substanciais nos teores de oxigênio dissolvido na água. Além disso, a montante do local de estudo, possivelmente não há fontes pontuais (esporádicas ou sazonais) significativas de matéria orgânica, que possam propiciar uma diminuição dos teores de oxigênio na água através do consumo pela decomposição.

O aumento na concentração de MST observado no período de precipitações mais intensas, deve ser atribuído provavelmente à maior participação proporcional da fração inorgânica do material particulado transportado pelo rio. Esse material alóctone, incluindo íons, deveria propiciar aumento na condutividade elétrica. A maior entrada de água proveniente da bacia de drenagem resulta numa diminuição proporcional das concentrações de íons dissolvidos e, conseqüentemente, na condutividade elétrica, caracterizando portanto um efeito de diluição. Henry (dados não publicados),

 

trabalhando em Campina do Monte Alegre, a montante do local deste estudo, demonstrou através do desenvolvimento de modelo, a diminuição da condutividade elétrica com o aumento da vazão, corroborando o efeito de diluição como hipótese explicativa. Thomaz et al. (27) também atribuiu às menores concentrações de nutrientes observadas no rio Baía (MS, Brasil) no período de cheia à diluição decorrente da subida das águas do rio Paraná. As menores concentrações das frações de fósforo observadas na água do rio e no estande no período de maior precipitação também atestam o efeito de diluição.

Com relação ao padrão de variação alternado dos teores de nitrato e de amônia sugerido, processos relacionados à ciclagem do nitrogênio, particularmente à nitrificação, devem ser cogitados na explicação dessas oscilações.

Thomaz et al. (28) não observaram padrão tão marcante na variação do nível da água do rio Paraná e Ivinheima, quando comparado com o do rio Paranapanema. Segundo esses autores, o controle da vazão do reservatório de Itaipu se faz sentir sobre os níveis fluviométricos do rio Paraná, especialmente durante o período de seca. Na zona de desembocadura do rio Paranapanema, o padrão sazonal observado no nível da água é decorrente principalmente da operação do reservatório, com alterações de vazão em função da demanda. Uma defasagem de cerca de um mês entre o período de maiores precipitações e a elevação da cota do reservatório foi também constatada.

Em Campina do Monte Alegre (rio Paranapanema, a montante de sua zona de desembocadura), Henry (9) determinou através de coletas bimensais de maio/88 a março/89, uma variação nas concentrações de nitrato de 74,2 a 137,0mg/l; de FTD de 2,57 a 59,0mg/l e de MST de 14,5 a 67,3mg/l. No presente estudo, as concentrações de FTD e de MST foram semelhantes às obtidas por Henry (9). Em relação ao nitrato, concentrações mais altas e com maior variabilidade foram encontradas. Estas diferenças podem ser atribuídas à maior intensidade das amostragens efetuadas neste estudo e a influxos das zonas marginais, como as lagoas.

Segundo Howard-Williams & Lenton (12), na zona litoral de lagos com grande cobertura de plantas aquáticas, a desoxigenação da água é devida principalmente a três fatores: (a) reduzida movimentação da massa de água em função da presença da cobertura vegetal interferindo na oxigenação, (b) baixas taxas de fotossíntese fitoplanctônica na região de macrófitas aquáticas e, conseqüentemente, baixa produção de oxigênio, em função da menor intensidade luminosa e (c) rápido consumo do oxigênio produzido pelas plantas por organismos presentes no interior dos estandes. Além desses fatores, a temperatura mais elevada observada na superfície da água no estande reduz a solubilização desse gás e, consequentemente, a sua concentração na água. Kunii et al. (16) observaram período de considerável diferença na concentração de oxigênio dissolvido entre a superfície e o meio com o fundo em Ojaga-ike (Japão), uma lagoa rasa e eutrófica. Segundo os autores, a maior concentração de oxigênio dissolvido observada na superfície dessa lagoa pode ser devida à sua liberação, durante a atividade fotossintética das macrófitas aquáticas na camada superior, ou ainda devido ao seu maior consumo pela decomposição que ocorre no fundo, acarretando diferenças elevadas entre a superfície e o fundo. Provavelmente, os fatores assinalados anteriormente, atuando em conjunto, devem ser os responsáveis pelo padrão de variação anual da concentração de oxigênio dissolvido no estande de E. polystachya. Esses fatores também devem ser os responsáveis pelo gradiente constatado no estande entre superfície e meio e fundo. Os menores teores de oxigênio dissolvido determinados na água do estande de E. polystachya, quando

 

comparados com os teores determinados na água do rio e da baía, podem ser explicados por processos mais intensos de decomposição no estande do que no rio, ocasionando maior consumo de oxigênio e, consequentemente, diminuição dos seus teores na água. Assim, os teores de oxigênio dissolvido determinados na água do rio refletem principalmente influências externas, relacionada ao padrão sazonal de variação da temperatura do ar. As concentrações determinadas na água presente no interior do estande de E. polystachya refletem principalmente processos internos, como produção e decomposição.

As diferenças significativas entre as temperaturas e as concentrações de oxigênio dissolvido encontradas na água do rio e no interior do estande, bem como o gradiente térmico observado no estande, pode ser explicado pela presença do estande de E. polystachya. Este atua como barreira física à passagem da água e à ação do vento. Assim, haveria menor renovação da água, com seu tempo de residência aumentado e a mistura da massa d’água pela ação do vento seria reduzida. A falta de correlação entre as variáveis físicas e químicas da água do rio e do estande, também ressalta as diferenças entre as massas de água.

As diferenças observadas entre as concentrações de oxigênio dissolvido, de MST e da temperatura na água do rio, do estande e da baía, podem estar relacionadas à variação do nível da água (2, 25, 26, 28). Como a baía estudada é rasa e, em períodos de águas baixas, encontra-se mais isolada do rio (19), estas características sugerem que processos internos, como a circulação da massa d’água pela ação do vento, também devem ser responsáveis pelas diferenças apontadas. Em decorrência das baixas profundidade e velocidade da corrente, além da presença de períodos com estratificação térmica, a baía estudada pode ser considerada como um ambiente intermediário entre lêntico e lótico de natureza polimítica (19).

 

AGRADECIMENTOS

 

À FAPESP (Projeto Temático: proc. 91/0612-5) pelo suporte financeiro e pela bolsa de estudos (proc. 92/2886-8) e aos Srs. H.A. Rodrigues e M.F.P. de Oliveira pelo auxílio nos trabalhos de campo e de laboratório.

 

ABSTRACT

 

The influence of the macrophyte Echinochloa polystachya (H.B.K.) Hitchcock on the physical and chemical characteristics of water in the mouth zone of Paranapanema River into the Jurumirim Reservoir - SP. In the mouth zone of Paranapanema River into the Jurumirim Reservoir (SP, Brazil), the emergent macrophyte E. polystachya dominate the vegetal physiognomy. This plant is rooted into the marginal area of the water body and stems towards the pelagic region. The seasonal

 

patterns of physical and chemical variables of water in the stand of this grass and in the main river channel were studied. The annual variation of the water temperature and dissolved oxygen concentrations is due to the modifications on the air temperature. The changes on the concentrations of suspended matter and on the electric conductivity were associated to the precipitation regime during the year. An homogeneity on the physical and chemical factors in the river was observed and was due to the movement of the water mass. In the stand, the surface layer presented different characteristics when compared with the intermediary and deep zones. A comparison between the values of temperature and dissolved oxygen concentrations in the stand water and in the river showed that the differences were statistically significant. These can be attributed to the presence of E. polystachya, that acts like a physical barrier on the water and to the wind action.

 

Key-words: macrophyte, Echinochloa polystachya, dam, Paranapanema River, hydrological cycle, physical and chemical characteristics

 

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